Uma lei contra tiranos… aplicada a um juiz do STF?

A Lei Magnitsky Global é uma legislação norte-americana criada para punir indivíduos estrangeiros acusados de corrupção sistemática ou violações graves dos direitos humanos. Inspirada no caso do advogado russo Sergei Magnitsky — que morreu em 2009 após denunciar um esquema de corrupção envolvendo autoridades do governo russo —, a lei permite aos EUA impor sanções unilaterais a qualquer pessoa fora do país que esteja envolvida em práticas como:
- Prisões arbitrárias;
- Tortura e repressão política;
- Censura à liberdade de expressão;
- Desvios de fundos públicos ou enriquecimento ilícito.
A versão global da lei, aprovada em 2016, transformou-a em uma poderosa ferramenta de diplomacia punitiva, usada tanto contra ditadores quanto contra líderes empresariais e membros do Judiciário de outros países. As sanções envolvem:
- Congelamento de bens nos EUA ou em qualquer transação em dólar;
- Proibição de entrada no território norte-americano;
- Impedimento de transações com empresas e cidadãos americanos;
- Danos reputacionais globais, já que muitos países e instituições privadas seguem essa lista informalmente.
Alexandre de Moraes: o juiz que virou alvo do império
Em julho de 2025, os Estados Unidos anunciaram que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, foi oficialmente incluído na lista de sanções da Lei Magnitsky. A medida, assinada pelo presidente Donald Trump, alega que Moraes está envolvido em:
- Prisões ilegais de opositores políticos;
- Censura sistemática à imprensa e às redes sociais;
- Processos judiciais motivados politicamente, especialmente contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, aliado de Trump.
Segundo o Departamento do Tesouro americano, Moraes teria “abusado de sua autoridade para perseguir adversários políticos e suprimir liberdades civis no Brasil”. O governo dos EUA ainda alegou que ele “atuou como juiz e carrasco” em uma “campanha de perseguição política”.
É a primeira vez que um juiz supremo de uma democracia consolidada é colocado na lista negra da Lei Magnitsky — antes, ela era aplicada contra nomes de regimes autoritários, como Rússia, China, Irã e Venezuela.
O que as sanções significam na prática?
Embora Moraes não tenha bens públicos conhecidos nos Estados Unidos, a aplicação da lei gera consequências imediatas e sérias:
- Qualquer ativo em dólar vinculado ao nome dele pode ser bloqueado por bancos internacionais;
- Ele está proibido de entrar nos EUA ou obter qualquer tipo de visto americano;
- Plataformas digitais como Google, Apple, Meta (Facebook, Instagram, WhatsApp), que são empresas americanas, podem ser pressionadas a suspender suas contas pessoais;
- Instituições financeiras brasileiras que operam com o dólar estão revendo contratos e transações para evitar sanções secundárias — o Bradesco, por exemplo, já convocou sua equipe de compliance para avaliar o caso.
A sanção, mesmo sem prisão ou ação direta, isola Moraes do sistema financeiro e diplomático ocidental — um tipo de “morte civil internacional”.
Por que Trump fez isso?
Para analistas internacionais, Trump aplicou a sanção com motivações claras:
- Reforçar o apoio político a Bolsonaro, que foi declarado inelegível por Moraes após uma série de investigações sobre tentativa de golpe em 2022;
- Acusar o Judiciário brasileiro de parcialidade, num movimento que ecoa o discurso de Trump sobre “deep state” e “justiça aparelhada”;
- Mandar um recado para seus próprios eleitores, mostrando força contra adversários ideológicos, mesmo fora dos EUA.
Ou seja, ao sancionar Moraes, Trump também busca reconstruir sua imagem internacional como defensor da liberdade de expressão e perseguição política — desde que seja contra seus adversários.
O Brasil respondeu?
Sim. O governo brasileiro classificou a sanção como uma interferência externa grave na soberania nacional. O Itamaraty emitiu nota dizendo que “nenhuma autoridade brasileira está acima da lei brasileira, mas também não está abaixo de governos estrangeiros”. O presidente Lula declarou apoio ao STF e reafirmou que o Brasil não aceitará sanções políticas unilaterais contra membros de sua Suprema Corte.
Ainda assim, o episódio agrava as tensões diplomáticas entre Brasil e EUA — e abre um precedente perigoso: o uso de sanções judiciais como arma de pressão geopolítica entre democracias.
Em resumo
A inclusão de Alexandre de Moraes na lista de sanções da Lei Magnitsky Global marca um momento inédito e explosivo nas relações entre Brasil e Estados Unidos. Seja por motivações políticas ou ideológicas, o gesto de Trump lança luz sobre a fragilidade do equilíbrio entre independência judicial e pressão internacional. Moraes, para uns, é o defensor da democracia contra o extremismo. Para outros, um censor autoritário disfarçado de juiz.
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